Gripe aviária: Conheça o vírus que vem preocupando o setor da avicultura mundial


Atualmente, com os frequentes focos da doença no Brasil e  no mundo, é importante conhecer e saber se preparar para uma possível epidemia. 

A Influenza aviária, mais popularmente conhecida como Gripe aviária, é uma doença de aves domésticas e silvestres, transmitida através do vírus altamente patogênico influenza A (IAV). Trata-se de uma zoonose, ou seja, o vírus é capaz infectar tanto aves, quanto mamíferos, incluindo seres humanos, sendo transmitido de forma eficiente através de aerossóis respiratórios, fezes e fluídos corporais, seja diretamente, por proximidade hospedeiro-hospedeiro, ou indiretamente, pela água ou objetos contaminados. 

Em aves domésticas a doença é caracterizada principalmente por alta mortalidade e problemas respiratórios tais como tosse, espirro, muco nasal e hemorragia nas partes desprovidas de penas e mucosas. Sinais clínicos nervosos podem acontecer, tais como andar cambaleante das aves e, no caso de aves de postura, ocorre queda de produção de ovos.

No Brasil, a gripe aviária é uma doença de notificação obrigatória imediata aos órgãos oficiais de defesa sanitária animal. O diagnóstico oficial da doença também deve ser comunicado internacionalmente aos órgãos de defesa sanitária animal e a países importadores. Surtos da doença levam a uma série de barreiras sanitárias para a comercialização de produtos avícolas no mercado interno e externo, uma vez que produtos avícolas não tratados termicamente e oriundos de lotes que tiveram a doença têm a capacidade de hospedar e servir como fonte de inóculo do vírus. Tal medida de controle acarreta em enormes prejuízos econômicos para a avicultura comercial, podendo tornar-se uma ameaça também à saúde humana, por isso os focos da doença devem ser muito bem acompanhados para não chegarem a tanto. 

O vírus

Os vírus influenza tipo A (IAV) são classificados em subtipos de acordo com suas diferentes glicoproteínas de superfície, dentre elas hemaglutinina (HA) e neuraminidase (NA). Até a atualidade,  18 subtipos diferentes de hemaglutinina (H1-H18) e 11 subtipos diferentes de neuraminidase (N1-N11) são de conhecimento dos pesquisadores, com apenas alguns desses subtipos circulando em seres humanos, o que seria a gripe sazonal. 

Dependendo do hospedeiro de origem, o vírus Influenza A também pode ser classificado como gripe aviária, gripe suína, gripe humana e outros tipos de vírus da gripe animal. As aves são suscetíveis a uma ampla variedade de cepas de vírus Influenza A dos subtipos H1 a H16 e N1 a N9. 

Os IAVs também podem ser classificados pela categoria e subtipo de patogenicidade, existindo  duas categorias de vírus: alta patogenicidade e baixa patogenicidade. Apenas alguns subtipos de IAVs (H5 e H7) têm capacidade para se tornar classificados como de alta patogenicidade (Highly Pathogenic Avian Influenza – HPAI), embora outros subtipos como H9 possam causar doenças com prejuízos significativos. Os vírus de alta patogenicidade H5 ou H7 são assim qualificados através de teste de virulência realizado em aves domésticas de interesse comercial e está associado à aptidão do vírus de causar lesões severas e alta mortalidade nestas aves.

Os IAVs de baixa patogenicidade (Lowly Pathogenic Avian Influenza – LPAI) usualmente não causam sinais clínicos em aves silvestres ou então causam apenas sinais clínicos leves em aves domésticas. Mesmo assim, quaisquer vírus LPAI que sinalizem infectar e causar impactos graves a seres humanos também devem ser relatados e notificados. Também, qualquer infecção por vírus dos subtipos H5 e H7, mesmo quando diagnosticadas em aves silvestres e sendo consideradas LPAI, são notificáveis, porém não estipulam barreiras comerciais à avicultura. A notificação dos vírus H5 e H7, mesmo em aves silvestres, é necessária como alerta de riscos para as aves domésticas, especialmente para a avicultura comercial, por serem os subtipos de vírus mais relacionados à capacidade de se adaptarem e atingirem a alta patogenicidade em aves domésticas e, como consequência, causarem surtos graves, com altas taxas de mortalidade de aves e perdas econômicas por barreiras sanitárias.

Quando a infecção for diagnosticada como sendo causada por algum subtipo de vírus de baixa patogenicidade, salvo às exceções anteriores, a gripe aviária não é diagnosticada como doença e não é notificável. Aves aquáticas como patos, marrecos, gansos e cisnes (Anseriformes) são considerados hospedeiros naturais dos vírus de baixa patogenicidade da influenza aviária, com baixo efeito nocivo.

Complexidade da vacinação

Por seu material genético ser composto unicamente por um genoma de RNA, os vírus de influenza estão propensos a frequentes mutações, uma vez que não são capazes de fazer correções no processo de cópia do RNA durante a replicação do genoma viral para produção de novas partículas víricas. Estas mutações constantes causam alta variabilidade dos vírus de influenza e, consequentemente, os problemas com a proteção inconclusa conferida pelas vacinas e pela variabilidade na patogenicidade dos diferentes vírus.

Os vírus Influenza A muito regularmente podem permutar genes, principalmente em aves, gerando novos vírus, sendo que este processo de combinações de genes possui um impacto importante na biologia e evolução dos vírus na natureza e na complexidade quanto ao custo e eficácia de programas de vacinação. Devido à dinâmica evolução dos vírus de influenza é preciso a contínua análise de cepas vacinais a serem utilizadas para a vacinação.

O papel da biologia molecular nas estratégias de controle

No Brasil, as estratégias para controle da gripe aviária são definidas por Portaria Ministerial sobre Diagnóstico e Controle de Influenza Aviária e Doença de Newcastle, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), que prevê todas as ações que devem ser tomadas pelos órgãos oficiais para conter focos da doença. A portaria define perímetros de contenção de focos, testes de diagnóstico e procedimentos de descarte de animais contaminados, comercialização, abate, etc.

O MAPA, além de estabelecer o Plano de Contingência, perpetua programas de treinamento de técnicos da Defesa Sanitária Animal (DSA) sobre o diagnóstico da doença, simulação de surtos e procedimentos de controle. Os Serviços de DSA, no âmbito federal e estadual, são agentes da vigilância de fronteiras, portos, aeroportos e recebimento de notificações de suspeitas. Apenas os Serviços Oficiais podem atuar no reconhecimento e controle oficial de suspeitas de influenza.

De acordo com a pesquisadora Clarice Arns, do Laboratório de Virologia Animal do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), poucos laboratórios de biologia molecular estão qualificados para realização de diagnósticos rápidos de gripe aviária caso o País confronte com uma epidemia. Segundo ela, os laboratórios devem ser classificados como de segurança máxima para lidar com o vírus vivo, por ser de alta periculosidade, o que restringe as possibilidades de laboratórios disponíveis. Laboratórios estaduais e do Ministério da Saúde, como o Adolfo Lutz e a Fiocruz, detêm somente tecnologia de análise molecular para casos de influenza humana. No âmbito do Ministério da Agricultura, apenas os laboratórios de Campinas (SP) e Pedro Leopoldo (MG) atendem as condições para realizar testes de infecção em animais.

Um laudo completo de identificação e classificação do vírus a partir de culturas in vitro e testes com animais leva 30 dias para serem concluídos. Já a análise molecular, com base no código genético do RNA do vírus, leva apenas algumas horas.

Referências Bibliográficas

EMBRAPA SUÍNOS E AVES. Sanidade animal: Influenza aviária. [S. l.], 22 maio 2023. Disponível em: https://www.embrapa.br/suinos-e-aves/influenza-aviaria. Acesso em: 8 jun. 2023.

IBIAPINA, Cássio da Cunha; COSTA, Gabriela Araújo; FARIA, Alessandra Coutinho. Influenza A aviária (H5N1): a gripe do frango. Jornal Brasileiro de Pneumologia, v. 31, p. 436-444, 2005.

LOPES, Adriana D., et al.  Risco de gripe aviária. O Estado de São Paulo, 04/11/2005, Vida&, p. A18.


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