Leite A2: Uma nova tendência no mercado de laticínios


O leite A2 é uma nova tendência que vem gerando o interesse de pesquisadores, produtores e consumidores do setor de laticínios. No mercado Brasileiro já é uma realidade, podendo ser encontrado em diversos pontos de venda em todo o país. Para o consumidor, o produto é uma opção mais fácil de digerir, enquanto para produtores e indústrias, representa uma chance de agregar valor à matéria-prima e se destacar no mercado.

O que é o leite A2?

Para entendermos o que é o leite A2A2 – ou apenas A2 comercialmente – temos que primeiro entender a composição do leite. O leite é uma combinação de porções sólidas em água. Os elementos sólidos representam aproximadamente 12 a 13% do leite e a água, aproximadamente 87%. Os principais elementos sólidos do leite são lipídios (gordura), carboidratos, proteínas, sais minerais e vitaminas.

Dentre as proteínas presentes estão a Caseína (cerca de 80%) e as Albumina e Globulina, proteínas do soro (cerca de 20%). Estas em conjunto são responsáveis pela maior parte das características físicas (estrutura e cor) encontradas nos produtos lácteos.

A caseína, principal proteína do leite, é representada por diferentes tipos, dentre eles alfa s1, alfa s2, kappa e beta-caseína, sendo esta última o objeto de estudo e importância no caso do leite A2. A beta-caseína pode sofrer algumas variações genéticas, produzindo diferentes aminoácidos: histidina, no caso do alelo A1 (β-caseína A1), e prolina, no alelo A2 (β-caseína A2).

O leite A2 deriva de vacas que possuem exclusivamente a variante A2 da proteína beta-caseína.

Produtos laticínios com este tipo de seleção são menos propensos a causar desconforto no organismo pela fermentação ou má digestão do leite e que podem afetar pessoas com dificuldades para digerir a β-caseína A1. Para aqueles que não são intolerantes ou alérgicos e que frequentemente sofrem de desconforto abdominal ao consumir lácteos, o leite contendo apenas β-caseína A2 é uma alternativa mais fácil de digerir.

A genética A2A2

Existem três genótipos possíveis no gado de leite: homozigoto, onde o genótipo com alelos A1A1 determina que o animal produza apenas a β-caseína A1; e indivíduos com o genótipo de alelos A2A2 produzem somente β-caseína tipo A2; e vacas heterozigotas, com o genótipo A1A2 que produzem os dois tipos de β-caseína.

Pesquisas na área de melhoramento genético ainda estão em andamento para identificar, por meio de análise genômica, quais raças apresentam maior incidência de animais com genótipo A2A2, mas já se observa grandes avanços neste quesito.

A frequência do alelo A2 é geralmente baixa em raças Holandesas e Taurinas, com exceção da raça Guernsey. No entanto, em raças zebuínas, a frequência do alelo A2 é maior, demonstrando um grande potencial de produção ao utilizar essas raças. Além disso, a seleção assistida também é mais fácil execução quando se trata destas.

De acordo com as pesquisas, as raças Sindi, Gir leiteiro, Gir, Girolando, Guzerá e Raça Vermelha Norueguesa apresentam maior probabilidade de possuírem os alelos para A2 da beta-caseína. Já as raças Caracu e Jersey têm maior probabilidade para a heterozigosidade (A1A2). Estudos realizados no Brasil revelaram que a frequência do alelo A2 em animais da raça Guzerá foi de 97% em 93% dos animais analisados, enquanto que no Gir leiteiro foi de 98% em 96% dos animais. Esses resultados apontam para o potencial genético das raças zebuínas na produção de leite A2.

Benefícios a saúde

Durante a digestão da beta-caseína A1 no trato gastrointestinal humano ou no processamento do leite para produção de laticínios, um de seus subprodutos finais é a beta-casomorfina7 (BCM-7), um peptídeo bioativo. Após sua formação, a BCM-7 ativa os receptores µ-opióides encontrados no trato gastrointestinal e em outras partes do corpo humano. Esse composto é considerado um possível fator de risco para o aparecimento de problemas de saúde.

O leite A2A2 é objeto de estudo por causa da baixa liberação de BCM-7 durante a digestão da β-caseína A2, que é quase nula, tornando um dos possíveis motivos para o leite A2 ser benéfico para a saúde.

De acordo com uma pesquisa em modelos animais, o leite A2 tem propriedades benéficas para a morfologia e imunologia intestinal. O estudo foi realizado para avaliar o efeito do leite A2 na condição do envelhecimento, que afeta negativamente a função imunológica e a composição da microbiota intestinal. Contudo, os resultados mostraram que o grupo alimentado exclusivamente com leite A2A2 apresentou níveis mais elevados de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC) fecais, especialmente o isobutirato, sendo este contribuinte da reconstrução do trânsito intestinal.

O uso do leite A2 mostrou-se promissor para melhorar o trânsito gastrointestinal em idosos, tornando-o mais fisiológico em relação ao leite convencional. No entanto, mais estudos em humanos são necessários para confirmar esses resultados.

Além disso, estudos mostraram que o leite A2 tem menores marcadores de inflamação, como IL-4, IgG, IgE e IgG1, quando comparado com o leite A1/A2. Também é menos provável que cause desconforto digestivo e frequência de fezes amolecidas em comparação ao leite comum.

Outro estudo em animais apresentou menos sinais de danos cardiovasculares no grupo alimentado com leite com β-caseína A2, em comparação com o leite A1/A2. Os animais alimentados com leite A2 não apresentaram danos às artérias, mesmo após a ingestão de colesterol, enquanto o grupo A1 apresentou maior área da aorta coberta por estrias gordurosas e maior espessura nas lesões, ou seja, maior risco cardiovascular.

Portanto, o leite A2 aparenta ser uma alternativa dietética viável, especialmente para indivíduos que relatam desconforto gastrointestinal após o consumo de leite de vaca não associados à lactose.

Alergia x intolerância

No Brasil, cerca de 53 milhões de pessoas relatam ter dificuldade em digerir o leite. Muitas vezes, esses sintomas podem ser confundidos com intolerância à lactose, uma vez que são bastante similares. No entanto, a alergia ao leite de vaca e a intolerância à lactose são problemas distintos.

A intolerância à lactose ocorre em pessoas com deficiência na produção da enzima lactase, que quebra as moléculas de lactose durante a digestão e as transforma em energia para as células do corpo humano. Essa deficiência pode resultar em dores abdominais, diarreia, flatulência e abdômen distendido. Por outro lado, a alergia às proteínas do leite de vaca, representadas em maior parte pelas Caseínas, podem desencadear várias reações, algumas semelhantes às da intolerância à lactose, mas também pode causar inchaço, erupções cutâneas, tosse, dificuldade para respirar e inchaço na garganta, entre outros sintomas.

Por isso, é importante destacar que o leite A2 não é indicado para intolerância à lactose, pois ainda contém concentração de açúcar.

Produção e certificação

A produção de leite A2 é um processo que envolve seleção genética. Para identificar se as vacas são capazes de produzir apenas beta-caseína A2, as fazendas precisam realizar o mapeamento genético do rebanho. As vacas selecionadas devem ser separadas e inseminadas artificialmente com sêmen de bovinos que também apresentem genótipo A2A2.

No ano de 2019, a Integral Certificações lançou o Selo VACAS A2A2, que certifica a origem e a rastreabilidade do leite A2 por meio de certificação de terceira parte. Para melhorar a transparência e a robustez do processo de certificação, a Integral Certificações e a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) assinaram um acordo de cooperação. A certificação é opcional e pode ser solicitada por produtores rurais e indústrias, desde que cumpram as regras estabelecidas no protocolo VACAS A2A2. Após auditorias de terceira parte realizadas por certificadoras credenciadas ao programa, a Integral Certificações concede o selo aos produtores e indústrias que atenderem aos requisitos. Os processos de genotipagem dos animais, identificação, obtenção, armazenamento, logística e processamento do leite são avaliados para garantir a rastreabilidade e impedir a mistura de leite contendo a β-caseína A1.

Fonte: CNA SENAR

O protocolo ainda está em fase de implementação, sendo destinado a ser utilizado em todo o país e tem como objetivo cumprir os requisitos necessários para rotulagem, identificação e utilização do selo VACAS A2A2. Esse programa propõe garantir que os produtos sejam oriundos exclusivamente de animais identificados e acompanhados pelo programa, mas a certificação do gado ainda  não garante autenticidade no produto final. 

O laboratório LaborGene propõe análise genética do produto final para comprovação do leite A2, respaldando processos e assegurando a qualidade dos produtos disponíveis no mercado.

Referências bibliográficas

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